Pela primeira vez vou poder expor tudo o que realmente aconteceu, o que jamais será visto, jamais será lido por pessoas que me conhecem ou se importam. Muito menos pela pessoa que causou esta situação.
11 de Janeiro de 2012.
Acordei cedo, vesti minha calça clara, jeans surrado e uma camiseta listrada que havia ganho a poucos dias. Coloquei meu velho tênis e mal penteei o meu cabelo. Maquiagem pra que? Eu queria conforto. Seriam 3 dias dentro de um ônibus indo para um dos lugares mais isolados do Brasil que eu poderia imaginar. Arrumando minha bolsa, recordava da conversa que tive com meu pai no dia anterior.
"Lá só tem gente feia pai. E aquele sotaque é ridículo! Eu jamais vou morar lá, ok? Jamais. Nunca. Se você quer saber o que me traria a maior infelicidade do mundo, saiba que seria receber a notícia que teria que morar naquele fim de mundo sem futuro".
Bom, o lugar de gente feia e onde eu jamais moraria, era para onde eu estava indo agora.
O táxi demorou a chegar. Pensamos que ele pudesse ter esquecido... estava chovendo e era cedo demais. Mas quando uma ponta de desespero começou a surgir, o carro encostou em frente ao portão, cerca de 6:20. Hora de levar as malas, com discrição para não despertar os olhos e ouvidos fofoqueiros do condomínio.
Durante o caminho, eu observava as pessoas, a paisagem em meio as gotas de chuva que caiam no carro. Cheguei a encostar no ombro da minha mãe, na tentativa de tirar um cochilo ou descansar a mente. Quando passamos em frente a Dicico na Mooca, recordei-me do que havia deixado para trás há poucos dias: o sonho de ir para a faculdade. Aquele seria o caminho que eu faria, caso eu fosse estudar na São Judas. Mas bom, isto era um sonho, até então.
"Fê... a ficha só caiu agora. Nós vamos viajar!" - minha mãe me disse, quando levantei minha cabeça e decidi não dormir.
Quando chegamos, no lugar mais estranho possível, reparei que o taxista era um rapaz branco, alto e magro, pouco mais agradável fora do carro. Segurando meu travesseiro e passando por alguns mendigos e usuários da cracolândia, que acabara por ser desfeita, entramos na loja de passagens, aguardando a van que nos levaria até o local do ônibus. Lembro-me do rapaz da loja que parecia o Batista, da mulher, das reportagens sobre as estradas alagadas com as chuvas de início de ano. Moscas incontáveis, lugar desagradável, mas eu estava feliz, de alguma forma.
A van finalmente chegou e nós guardamos as coisas. Havia um pai com um garoto, seu filho e algumas outras pessoas, cujo os rostos já não me recordo muito bem. De repente, me lembrei que não tinha meu cpf. Como eu iria me inscrever no prouni? Sim, o sonho de pagar a faculdade havia desaparecido... mas o sonho de conseguir uma bolsa estava de pé. Mas sem cpf, isto não seria possível.
Quando chegamos a garagem, um lugar simples, com algumas cadeiras e um banheiro, o meu desespero começou a aumentar. Nos sentamos, ao lado de um rapaz de boné e olhos pequenos, que carregava muitos dvd's de forró, sertanejo, filmes e forró. Parecia simpático e eu estaria mais feliz... mas o fato de não ter meu cpf não me deixava tranquila. Liguei para a etec, conversei com a dona Vera, mas ela informou não ter o número. Pronto. Foi o bastante para eu começar a chorar em frente todas aquelas pessoas. Procurei na internet do meu celular - sente o drama - alguma forma de obter o número.
Chorei, chorei, chorei, chorei. Meu pai prometeu que meu padrinho daria um jeito. Eu? Continuei chorando.
Amigos, foi a partir daqui que algo aconteceu. Eu queria saber que horas eram para poder gravar isto. Deveria ser cerca de 10 horas da manhã ou 11, não sei ao certo... mas sei que este breve e próximo momento mudou o meu interior. Hoje é dia 28 de abril de 2012 e eu me recordo perfeitamente, como se tivesse acontecido há poucos segundos. Não esperem uma grande história de amor. Não esperem uma história que mudará a vida ou pensamento de vocês. Apenas saibam o quanto pequenas coisas podem significar tanto para mim.
Enquanto derramava minhas lágrimas, segurando meu celular em busca de mais informações, a van voltou com mais passageiros. Como um imã, meus olhos se desviaram para um garoto que desceu segurando uma bolsa em cada mão. O segui com os olhos, vendo-o deixar as bolsas lá no canto e voltando para ver se haviam mais. Não havia e ele voltou. Usava boné, bermuda e uma camiseta. Não sei explicar como, mas naquele momento eu parei de chorar. Instantaneamente.
"Vai dar tudo certo. Otávio vai dar um jeito, relaxa" - meu pai repetia várias vezes.
Peguei meu espelho e vi o quanto meu rosto estava inchado e meu nariz vermelho. Precisava dar um jeito naquilo, rápido. Peguei meu lápis de olho, passei. Passei base e estiquei a face, com fim de fazer com que ela voltasse a sua cor normal e os rastros de choro sumissem.
Buscava encontrar o garoto com o olhar, mas era um pouco difícil. Haviam muitos homens perto dele, em volta dele. E para o espaço que tinha, ele estava um pouco distante.
Falei para a minha mãe que havia um garoto lindo ali, mas ela não o viu. Fomos até o banheiro, em uma tentativa frustrada de usar a chapinha, mas não deu certo. Aos poucos, meu rosto já estaria recomposto.
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